Ilustração por

Sobre contos e pespontos

Entre um conto e outro, alguns pespontos. Preciso dos pespontos para manter o principal equilibrado e firme. Preciso todo o tempo... Aprendi a pespontar quando a minha mãe me ensinou a fazer flores. Não, não se aprende a pespontar quando se faz flores. Essas apenas me lembram a minha mãe que me ensinou a pespontar os arranjos que a vida nos dá.



segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

MEU NOTURNO É VOCÊ


Esfrego os olhos. Borro os olhos. Tenho pressa, o ano velho está por hoje e eu já me vasculhei toda à procura de qualquer coisa para você. Mas, além dos olhos borrados, o que mais tenho para lhe oferecer? Nada, meu bem. 

Quem tem é você. Tenho um monte de palavras que só saem quando querem e você tem este corpo que me apetece, que anda por aí, alheio a mim. Eu teria a curva dura da cintura, mais para perto do quadril, palavra que você não guarda. Eu teria água no corpo, o suficiente para fazer escorrer o teu, mas você erra na pronúncia. Cederia a curva alta dos montes, uma planície, alguma erosão na pele, mas você desconhece a palavra geografia. 

Esfrego os olhos, já não me importa o kajal. A maçã mordida, tão bela, oxida em cima da pia (foi fingidamente esquecida). 
Meu sutiã preto com alças de strass virou decoração. As horas noturnas não passam, o tempo parou. 

Sou poeta morta. Minha casa entrou em pane. Na geladeira, mofa a comida; no corpo, qualquer vontade.

Esfrego os olhos. Firmo os olhos e relembro aquele teu respirar que você deixou passar, assim que eu lhe disse, "I can take you with me"...

Escuta, escuta o meu sussurro... a noite caía lenta sobre o asfalto (a América é tão cinza...), ventava pouco, frio, gostoso (a gente parecia tão a sós...), eu tenho asas para voar, por que você não vem?


Por Suzana Guimarães