Imagem gentilmente cedida por Iracema Buscacio |
segunda-feira, 16 de junho de 2014
Inventário
Todos os amores são maiores que eu. Todas as histórias de amor ganham de mim. Todo o amor do outro brilha mais que meus opacos olhos, quase cegados por minha insanidade. Arranha-céus de amor, genuínos, verdadeiros; eu, um pedaço de quebrada de esquina, sob luz baixa, daquelas amareladas, daquelas decrépitas cidades das velhas, das órfãs, das preteridas, onde pousam moscas e aqueles cisquinhos que voam do asfalto. Eu, sempre, no final das contas, nada. Infeliz de mim que ouvi sem ter escutado, e, por isso, condenada por infinita gama de pecados que jamais cometi. Paguei pelo canto que outros cantaram.
Desinfeliz de mim que cri. Esperei debaixo de chuva pouca, ouvindo passos toscos, contando-os, fechando os olhos para os já possuir. Somente meus. E nada. E novamente outra chuva, mesma esquina, mesmas lembranças à meia-luz e, de novo, ouvindo sons, respirando-os, junto com cheiro de asfalto e fumo estragado. Estragado e velho.
Todos os amores sempre foram melhores que eu. E suas histórias. E de todos os pecados, o mais grave deles foi acreditar nisso, na beleza dos amores deles. Que nunca existiram.
Por Suzana Guimarães