quarta-feira, 11 de agosto de 2010
aCORdele
Suzana Guimarães
Quando você chegou, já era noite.
Recordo-me da plataforma negra, vinha um vento pela janela, tão espaçosa janela
De onde eu via o mundo passando, se equilibrando em linhas finas, tão finas!
O vagão do trem parando, parando...
Quando você chegou, eu me tornei estática.
Permaneço, enfim, o que fazer disso?
Era meado de qualquer coisa e eu sempre me senti atraída por metades
Metade da laranja, nunca quero mais.
Metade da cama, nunca a quero inteira.
Metade da madrugada, nessa hora, se acordada, me inteiro.
Metade de uma conversa no trem.
Meia-luz.
Quando você chegou, eu senti a boca aguando.
Suspendi o ar, trunquei minha respiração
Não havia ninguém naquela estação, além de você.
Havia sinais, um mapa bastante amarelado, ilustrações antigas, descoladas pelo tempo
Havia uma caixa dos correios, batendo a tampa da lata vazia
onde o vento havia acabado de bolinar.
Havia um som de música, muito longe, que eu não conseguia ouvir.
[Aí, chegou a moça de preto, ou o moço?
Alertou, me fez recordar...
Que eu então voltasse no tempo
E acordasse...
Quando você nasceu, mandaram me avisar.
Eu subia a trilha de Burle Marx
Tão colorida aquela trilha que subi por vários anos.
O mensageiro descia o caminho das flores, grama e árvores
Descia para me buscar, e eu já ia...
A gente se encontrou. Ele sentou e me fitou.
Era um cachorro de rua, feito todos os outros que lá viviam, próximos à casa dos livros.
De castanhos, seus olhos passaram para outra cor.
Eu vi.
Pensei que fosse reflexo dos jardins do paisagista
E segui em frente,
Não sem olhar dez mil vezes para trás.
Quando você nasceu, eu tinha de ser avisada.
E ele voltou. Encontrou-se comigo longe dos canteiros floridos
Deitou-se ao sol e me esperou passar.
Esperou pelo dia em que eu estivesse acompanhada.
E novamente ele se sentou, nos olhamos e o outro e eu vimos
a meia-tinta,
Eu vi a mudança de cor, o tom
Creio que ele queria a certeza da missão cumprida
Não corri. Entendi. Fui feita para entender e acordar]
Agora, veio você em pessoa.
Eu desci daquele trem
Para a noite escura e desolada
Quando você chegou naquela noite e se postou tão próximo à escada
Eu aguei e fiquei estática.
Você perguntou se eu havia chegado para a festa
Acenou para o longe.
Permaneci suspensa (pois faltou muito chão), paralisada.
Eu carregava uma mala, lotada, deixei que ela alcançasse o chão.
Vi que você carregava outra, parecia leve!
Ao teu lado, um cachorro. Sentado. Que me fitava tanto... igual a você.
Quando você chegou, já era noite.
Recordo-me da plataforma negra, vinha um vento pela janela, tão espaçosa janela
De onde eu via o mundo passando, se equilibrando em linhas finas, tão finas!
O vagão do trem parando, parando...
Quando você chegou, eu me tornei estática.
Permaneço, enfim, o que fazer disso?
Era meado de qualquer coisa e eu sempre me senti atraída por metades
Metade da laranja, nunca quero mais.
Metade da cama, nunca a quero inteira.
Metade da madrugada, nessa hora, se acordada, me inteiro.
Metade de uma conversa no trem.
Meia-luz.
Quando você chegou, eu senti a boca aguando.
Suspendi o ar, trunquei minha respiração
Não havia ninguém naquela estação, além de você.
Havia sinais, um mapa bastante amarelado, ilustrações antigas, descoladas pelo tempo
Havia uma caixa dos correios, batendo a tampa da lata vazia
onde o vento havia acabado de bolinar.
Havia um som de música, muito longe, que eu não conseguia ouvir.
[Aí, chegou a moça de preto, ou o moço?
Alertou, me fez recordar...
Que eu então voltasse no tempo
E acordasse...
Quando você nasceu, mandaram me avisar.
Eu subia a trilha de Burle Marx
Tão colorida aquela trilha que subi por vários anos.
O mensageiro descia o caminho das flores, grama e árvores
Descia para me buscar, e eu já ia...
A gente se encontrou. Ele sentou e me fitou.
Era um cachorro de rua, feito todos os outros que lá viviam, próximos à casa dos livros.
De castanhos, seus olhos passaram para outra cor.
Eu vi.
Pensei que fosse reflexo dos jardins do paisagista
E segui em frente,
Não sem olhar dez mil vezes para trás.
Quando você nasceu, eu tinha de ser avisada.
E ele voltou. Encontrou-se comigo longe dos canteiros floridos
Deitou-se ao sol e me esperou passar.
Esperou pelo dia em que eu estivesse acompanhada.
E novamente ele se sentou, nos olhamos e o outro e eu vimos
a meia-tinta,
Eu vi a mudança de cor, o tom
Creio que ele queria a certeza da missão cumprida
Não corri. Entendi. Fui feita para entender e acordar]
Agora, veio você em pessoa.
Eu desci daquele trem
Para a noite escura e desolada
Quando você chegou naquela noite e se postou tão próximo à escada
Eu aguei e fiquei estática.
Você perguntou se eu havia chegado para a festa
Acenou para o longe.
Permaneci suspensa (pois faltou muito chão), paralisada.
Eu carregava uma mala, lotada, deixei que ela alcançasse o chão.
Vi que você carregava outra, parecia leve!
Ao teu lado, um cachorro. Sentado. Que me fitava tanto... igual a você.
10 comentários:
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Eu já viajei de trem e foi tão mágico...e ela entrou no trem e eu fiquei na estação, vendo um céu fugir...Meu coração ficou batendo naquela estação, mas decidi, fui conhecer outras paisagens, paisagens humanas e grográficas e parti...e voltei...
ResponderExcluirSua caixa de correios logo terá amarelo, um amarelo sol, um CÈU, uns desertos, uma laranja e uma banana...só não foi o cachorro danado solto na noite porque não cabia no amarelo da caixa...
Outro dia aqui...espero as conchas na minha caixa, sempre vazia, mas tenho mirra no jardim, sim...e, uma enxaqueca que me enlouquece!
beijos, suzana...até breve, nas nossas casas, ou numa estação, no aeroporto, na rodoviária...
"Eu desci daquele trem. Para a noite escura e desolada"
ResponderExcluirExcelente poema cara amiga LilySu, vc continua a escrever maravilhosamente. Achei a poesia muito sensual.
BeijooO
Muito bacana esta viajem, tudo encaixa-se perfeitamente.
ResponderExcluirAbraço
Tenho que decodificar seu último comentário? Por fv, não faça isso! Acabei de receber 'os catadores de conchas', nossa, que livro grosso! Quero começar lê ainda hj, se essa enxaqueca for embora de vez! Em casa, não consegui levantar pra ir trabalhar e nem avisei, radicalizei, várias chamadas no celular do trampo e não atendo... o que acontece comigo, Lily/Suzana?
ResponderExcluirLi textos seus para uma amiga ao telefone, ela está encantada com sua prosa/versos!
Suzana, muitas vezes entro aqui e te juro:
ResponderExcluirNão sei o que dizer, das coisas que vc escreve.
Menina de Deus, você anestesia a minha almaaaaaaa rs.
Escreve maravilhosamenteeeeeeeeeeee BEM!
Beijoooooooooo Su!!!!
Parece, às vezes, que ela só chega quando tenho que descer do trem da próxima parada.
ResponderExcluirAdorei aqui, vou voltar.
Beijão!!!
Uau, Suzana, que maravilha!
ResponderExcluirMe pegou de jeito, rápido e forte feito um trem. Mas ô trem bão, sô!!!
De tirar o fôlego. Não dá nem pra falar que tem presentinho do Teopha pra você lá no DS...
Beijos
Anga,
ResponderExcluirTudo começou quando visitei o DS e me deparei com o texto sobre a Carmem Miranda, que achei ótimo. Eu ria o tempo todo, lembrando-me de todo aquele pomar, tantas frutas na cabeça... e aí fui comentar (as respostas aos comentários me fizeram rir mais ainda).
E, ao comentar, me lembrei dos saltos dela, aquela escada que ela subia para poder parecer mais alta. Eu disse ao Teopha que achava uma falta de consideração dela mesma para com ela, querer ser uma coisa que não era. Sou baixinha (o Teopha adorou saber disso), uso salto alto( que não chega a ser escada) apenas porque algumas roupas pedem e também porque acho sexy, mas não os uso nunca para parecer maior. Ele disse que queria escrever sobre isso e dedicaria a mim. Fui lá, li e adorei. O texto dele sobre a Carmen é ótimo, que me perdoem os admiradores dela de plantão.
Beijos!
P.S.: só após ler o aCORdele mil vezes é que percebi que ele é de tirar o fôlego. Acreditas?
A intensidade, a exatidão das sensações que seus textos transparecem - é pura beleza, te sigo!
ResponderExcluirOlá Doce Suzana ou Lily: Adorei o teu post muito intenso e lindo, vi que gostaste daquilo que eu escrevi para a Sil, Ja escrevi para outras blogueiras e agora vou escrever para ti, sou uma pessoa simples, quando faço amigas/os, guardo essas amizades no meu coração, e os trato por minhas belas e eternas doces flores, Agora peço desculpa por tatar por tu mas eu não consigo de outra forma porque não gosto que me tratem por você.
ResponderExcluirUm beijo.
Santa Cruz